Gruta da Lagoa Azul, em Nobres (MT) — Foto: Divulgação
O Parque Estadual Gruta da Lagoa Azul, em Nobres (MT), está ameaçado pela falta de regularização de terras, expansão do agronegócio e por passeios clandestinos. É o que mostram dados reunidos pelo Ministério Público de Mato Grosso, aos quais a imprensa teve acesso, e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
A imprensa também esteve no parque entre os dias 11 e 13 de fevereiro e registrou evidências dos problemas. Veja abaixo:
O parque foi criado em 2000, por meio da lei estadual 7.369 para proteger o ecossistema da região, incluindo a Gruta da Lagoa Azul, interditada em 1999 devido à degradação ambiental. Sua área de 12 mil hectares é fragmentada em pelo menos quatro partes por terras do assentamento Coqueiral/Quebó, onde famílias já moravam famílias desde a década de 1980 (veja no mapa abaixo).
Hoje, segundo a prefeitura, há cerca de 700 famílias que moram ao entorno do parque. No entanto, nem todos os moradores estão regularizados junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), responsável pela regularização de terras no Brasil.
Apesar de a legislação citar que as terras deveriam ser desapropriadas, essa determinação não foi cumprida pelo governo, que alegou que os assentamentos não impactam a reserva.
“A área do Parque Estadual Gruta da Lagoa Azul que foi cedida ao estado não está ocupada, já que não está situada no local do assentamento e sim em áreas de reserva legal. Desta forma, não cabe desapropriação e nem pode ser alterada por ser área protegida pela legislação”, disse a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), que é responsável pela administração do parque.
O promotor Willian Oguido, que, desde 2023, que acompanha e fiscaliza a situação do parque por meio de um procedimento administrativo ao qual a reportagem teve acesso, diz que a unidade de conservação foi criada sem planejamento e, agora, os moradores que vivem na região e o estado devem entrar em acordo para que o parque seja conservado, sem prejuízo à moradia das famílias.
“Um dos objetivos do plano de manejo era a regularização da área e a desapropriação ao longo do tempo, porque a região já era habitada por pequenos proprietários. Para desapropriar, é necessário um decreto do governo e pagamento de indenização. Esse procedimento costuma ser demorado, podendo a discussão ir ao judiciário. O acordo é sempre o melhor caminho”, explicou.
O plano de manejo, elaborado em 2006, diz que o parque é uma unidade de conservação integral e deve ser utilizado majoritariamente para educação ambiental e pesquisa científica. A recreação e o lazer são permitidos apenas em uma zona específica. E todas as atividades dependem de autorização prévia da Sema. Porém, o plano ainda não foi colocado em prática.
Em nota, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), responsável pela regularização de terras no Brasil, informou que “está bem delimitado o que é assentamento, lote, área de reserva legal e área objeto da cessão de uso em questão” e não há “qualquer ação ou acordo para que as famílias regularmente assentadas sejam retiradas da área”.
Parque Estadual Gruta da Lagoa Azul, em Nobres (MT) — Foto: Arte g1
Uma das principais consequências das invasões e atividades agrícolas na área é o desmatamento. Essa ocupação desordenada de turistas e animais que não fazem parte daquela fauna compromete a vegetação nativa, altera o ecossistema local e coloca em risco a biodiversidade do parque.
Um levantamento feito pelo Instituto Centro de Vida (ICV), a pedido do g1, indica a perda, nos últimos 15 anos, de ao menos 47 hectares de vegetação nativa dentro do parque (o equivalente a 0,5 km²), enquanto quase 4 mil hectares (40 km²) foram desmatados no entorno imediato do parque. Os dados foram retirados de imagens de satélite do Sistema Prodes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (veja imagens abaixo)
As imagens captadas por satélite destacam o desmatamento em vermelho — Foto: Prodes/Inpe
A expansão da soja, representada na cor bege, avança sobre áreas que antes eram vegetação nativa — Foto: Prodes/Inpe
Além disso, dados do do MapBiomas de 2023 mostram que uma área do parque foi desmatada para o cultivo de soja – mas não foi possível identificar a dimensão da área –, enquanto nas proximidades do parque há 7,3 mil hectares de plantio do grão.
Evidências reunidas pelo monitoramento do MP-MT e pela imprensa durante visita ao parque apontam que o desmatamento pode estar correlacionado à prática ilegal de agricultura no parque e à presença de animais invasores. Veja quais são:
A Sema informou que identificou e vai bloquear os acessos às trilhas clandestinas, mas não deu prazo para essa ação. A pasta disse ainda que está fazendo um levantamento de todas as atividades irregulares “para adotar as providências cabíveis contra os responsáveis”.
Com formações rochosas e uma lagoa de águas cristalinas em tons de azul, a Gruta da Lagoa Azul é um dos dos cenários naturais mais impressionantes de Mato Grosso. Segundo pesquisadores, a lagoa surgiu quando o lençol subterrâneo de água aflorou no local. A cor azul predominante na água envolve uma série de elementos, entre eles carbonato de cálcio e magnésio.
Em março de 2024, a imprensa mostrou que diversas denúncias foram registradas contras guias clandestinos por promoverem passeios irregulares na gruta, sem informar os turistas sobre a proibição. Na época, o valor da visita chegava a custar R$ 250 por pessoa. Em 2023, o jogador Deyverson, e a esposa dele, também visitaram a gruta. À época, o jogador compartilhou fotos do passeio romântico nas redes sociais.
Atualmente, os passeios seguem acontecendo sem autorização organizado por guias clandestinos da cidade. No dia 1° deste mês, seis turistas e um guia de turismo foram detidos no interior da gruta. No entanto, todos foram liberados.
Em nota, a Sema disse que as multas para a visitação passaram a ser aplicadas a partir neste ano, com a publicação da Portaria n°152/2025, de 6 de fevereiro, que dispõe sobre a proibição da visitação pública na Unidade de Conservação Parque Estadual Gruta da Lagoa Azul.
Placa sinalizando o Parque Estadual Gruta da Lagoa Azul e, ao fundo, um pasto com gado — Foto: Sofia Pontes/g1
Segundo o professor de geologia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Caiubi Kuhn, o avanço do agronegócio na área agrava o impacto ambiental, competindo com a fauna nativa e servindo como vetor de doenças. Além disso, o trânsito de animais pesados acelera o processo de erosão, prejudicando a vegetação e o solo, o que coloca em risco a estrutura das cavernas.
“Animais de grande porte, como o gado, podem causar impactos significativos no ambiente. O peso elevado e o trânsito constante criam trilhas que intensificam a erosão natural, agravada pelas chuvas. Além disso, cavernas não são locais adequados para esses animais, pois a presença deles pode comprometer tanto a estrutura do solo quanto a própria segurança dos bichos e dos visitantes”, pontuou.
Já sobre a presença de visitantes sem regulamentação, a representante do Instituto Matogrossense de Espeleologia, Natally Carvalho Neves, explicou que isso comprometea segurança humana e a conservação do ecossistema local. Segundo a representante, para garantir a segurança, é necessário limitar o acesso e seguir as diretrizes estabelecidas para a preservação do ambiente.
“O que está descrito no plano de manejo é a visitação de contemplação. A recomendação é não abrir para banho e sim apenas para contemplação. Em hipótese nenhuma as pessoas deveriam entrar lá, seja para garantir a segurança das pessoas e outra para manter a integridade biológica do local, a conservação dos animais que vivem nessa água”, reforçou.
Natally ressaltou ainda que a visitação desordenada tem causado alterações na água, principalmente devido à entrada de pessoas, o que pode comprometer a sobrevivência de espécies extremamente sensíveis, muitas delas raras e em risco de extinção.
A Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), responsável pela administração do parque, informou que o Plano de Manejo do Parque e o Plano Espeleológico da Gruta da Lagoa Azul, que trazem as normas de uso e manejo dos recursos naturais, estão em fase de implementação. No entanto, não deu prazo para finalização.
“Para a reabertura do parque é necessário a delimitação de lugares possíveis de serem visitados e a implantação de infraestrutura para segurança dos turistas e como forma de diminuir impactos à Unidade de Conservação, resguardando seus recursos naturais”, explicou.
Enquanto isso, a fiscalização fica sob responsabilidade do gerente da unidade de conservação contratado pela Sema, em conjunto com a Polícia Militar e agentes da Prefeitura Municipal de Nobres. Em nota, a Secretaria de Turismo, Indústria e Comércio de Nobres e Secretaria Municipal de Agricultura, Meio Ambiente e Assuntos Fundiários informaram que acompanham as movimentações sobre o Parque Estadual, mas que a responsabilidade de monitorar a área é da Sema.
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